Trilha sonora: “ Ribbons Undone” (música que Tori Amos compôs para a filha)
“Com todo o perdão da palavra, eu sou um mistério pra mim. E eu suponho que me entender não seja uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato. E nem eu me entendo, pois sou infinitamente maior que eu mesma, eu não me alcanço. Mas eu fui obrigada a me respeitar, pelo fato de não me entender. Qual palavra me representa? Uma coisa eu sei: eu não sou o meu nome. Meu nome pertence aos que me chamam.”
–Clarice Lispector
–Clarice Lispector
“Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar.”
–Cecília Meireles
–Cecília Meireles
Para se entender uma mulher, você precisa ler Manoel de Barros e saber dissertar sobre o cisco, falar com pedra, dominar a arte das miudezas e deixar o dia em “condições de boca”. Ler Guimarães Rosa para inventar uma língua que só ela entenda. E Miranda July, claro.
Entender que o local onde você coloca a pimenta no seu hamburguer faz toda a diferença. Experimentar e se deliciar com cada sentido e suas possibilidades. Estudar música, manjar de ritmo, tocar algum instrumento para entender que mulher se move em 3/4 ou 12/8 – igual a canção de Tori.
Você precisa entender que mulher é coisa feita de chuva, vento, fogo, mar, areia. De terra. De fruta (mulher se come). De cheiro. De guaraná e Viagra (mulher causa ereção). De céu e Sol (mulher clareia). De nuvem. Para se entender uma mulher, é preciso pisar descalço na grama molhada e depois deitar e imaginar seres mais reais que você e eu.
Você precisa entender que mulher não é livro, enigma, mistério, problema matemático, sonho psicanalítico, arquétipo junguiano ou mapa astral. Mulher não se interpreta. Mulher não se resolve. Mulher não se lê. Freud, Sherlock Holmes, Fermat e Harold Bloom não explicam. Se quiser saber, a última coisa que você deve fazer é tentar entender, adivinhar, solucionar ou perguntar. Talvez ela mesmo não saiba. Talvez ela fale algo que não é bem certo. Elas não mentem, só alternam verdades (é por isso que com mulher se dança).
Para entender uma mulher, você precisa esquecer o que é uma mulher.
É preciso chamá-la sem antes lhe perguntar o nome. Enxergá-la nua. Sempre. Em vez de adivinhar o desejo dela, oferecer o seu. Antes de entender, antes de ler, é preciso saber escrever uma mulher.
Você precisa entender, para se entender uma mulher, que o sabor da picanha só existe dentro da sua boca, que o som das fugas de Bach só nasce quando chega aos seus ouvidos, que a textura da mesa não tem realidade na ausência do toque. Uma mulher não é nada antes de seu encontro com coisas, seres e mundos. Então, para ver o feminino lá fora, é preciso atuar aí dentro. Agir. Para fazer nascer uma mulher, é preciso ser homem.
Para entender uma mulher, enfim, você precisa fazê-la suar, digo, faze-la sua mulher.